Voltar a Montessori – O Controle do Erro

Em Montessori, confiamos na criança. A criança também confia em si. Essa dupla confiança é possível primeiro graças à natureza mesma da criança: eles sabem o que fazer, e eles sabem qual caminho seguir em direção à vida e à independência. Um outro pilar dessa confiança é uma característica da relação que se estabelece entre o material, ou o ambiente, e o indivíduo em desenvolvimento. O nome dessa relação é Controle do Erro.

Montessori enumera características dos materiais e enumera características do ambiente preparado. O Controle do Erro está nas duas listas. Ele é a fundação da prática pedagógica com crianças até seis anos. É o que nos permite acreditar, não na criança, mas no material e no ambiente.

Muito sucintamente, o controle do erro é o que permite à criança perceber quando ela erra, sem que o adulto precise corrigir seu trabalho ou esforço. Esse princípio geral funciona de maneiras diferentes em aspectos diferentes da vida infantil em ambientes montessorianos, tanto domésticos quanto escolares.

Montessori dizia no livro Pedagogia Científica que “é necessário que o material oferecido à criança contenha em si mesmo o controle do erro”. Em alguns casos, isso é verdadeiro. Por exemplo, nos Encaixes Sólidos. Veja o material no vídeo abaixo:

Nos Encaixes Sólidos, se uma criança tenta colocar os cilindros nos orifícios e erra, mesmo que somente um, então não consegue terminar seu trabalho. É forçado, pelo material, a recomeçar e tentar outra vez. O professor não precisa apontar o erro da criança. Repare o que acontece, também em casa, quando a criança brinca com brinquedos de final aberto, que permitem a ela o brincar de verdade, e não uma brincadeira já previamente modelada pela indústria de brinquedos:

Nos dois casos, enxergamos o controle do erro corrigindo severamente a criança. Não há espaço algum para condescendência, tolerância, ou margem de acerto parcial para a criança: ou ela acerta, ou ela erra. Assim exato, preciso e firme é o material e o brinquedo, porque é a partir dessa firmeza, dessa base exata e da certeza da correção que a criança começará a educar os próprios sentidos.

Mais tarde, porém, os materiais montessorianos não apresentam controles de erro tão estritos. São mais sutis e delicados em seus apontamentos à criança. Deixam de gritar e sussurram. Isso acontece, por exemplo, com a Torre Rosa. Abaixo, novamente, você pode conhecer o material:

Quando uma criança chega à Torre Rosa, ela já passou pelos Encaixes Sólidos, ou já passou (necessariamente) por materiais de Vida Prática cujos controles de erro são mais do que evidentes. Nesse processo, ela começou a educar seus sentidos, é verdade. Mas muito mais do que isso, um processo novo aconteceu:

“O controle material do erro leva a criança a acompanhar seus exercícios com certa dose de raciocínio; seu senso crítico e sua atenção se intensificam sempre mais no sentido de uma maior exatidão, de uma figura que lhe permite distinguir as mais ínfimas diferenciações; a consciência da criança vai assim predispondo-se ao controle de seus erros, mesmo quando estes não forem mais de ordem material”. (grifo meu)

Para além do material, o ambiente da criança também traz o controle do erro. As mesas e cadeiras da sala são leves. Leves o suficiente para que, caso a criança esbarre nelas, a mobília caia ou se mova, fazendo barulho. Gritando, mesmo, para que a criança perceba que errou em seu movimento. As superfícies são claras. Assim, se alguma coisa cai, ou ultrapassa seus limites, isso pode ser rapidamente percebido pela criança.

Eu arriscaria dizer, com o risco do exagero, que na convivência entre as crianças o controle do erro é também presente: porque são livres para uma convivência genuína, e não comandada pelo professor, o comportamento de cada criança é corrigido pelo termômetro da resposta geral que, com a educação e gentileza garantidas pelo professor, indica ainda assim os comportamentos inadequados de cada um.

O controle do erro é uma das grandes ideias de Montessori. É uma das chaves para sua pedagogia. O professor, o adulto, então, não está nunca sozinho. Ele está acompanhado, diria Montessori, pelo ambiente que se comporta como um educador severo, e a criança sente seu olhar, escuta seus sussurros. Acompanhada por este ambiente exato e preciso, com seu auxílio mudo, autoeduca-se.

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2 comentários

  1. Gabriel, adoro seus textos, sempre me fazem refletir e melhorar a forma como posso “montessoriar” a vida dos meus filhos. Como está se tornando uma realidade no Brasil, gostaria de sugerir que você escrevesse a respeito de Montessori no Homeschooling, é possível? Ia me ajudar muito. 😉

    Abraços!

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