Você compra um brinquedo para seu filho. No dia seguinte (às vezes horas depois) ele pede outro. Você não compra, porque ele acabou de ganhar um. Mas ele insiste por dias, semanas… E você cede. Três dias depois alguma coisa lhe chama a atenção e – você adivinhou. Ele pede outro.
Isso já aconteceu comigo, e se você mora no mesmo planeta que eu, aconteceu com você também. A pergunta que fica é: Por que os brinquedos são ruins a ponto de só satisfazerem as crianças por algumas horas, e logo depois não são mais importantes, e elas querem o próximo?
A resposta quase está na pergunta. Para a indústria do brinquedo, que movimenta quase 10 bilhões de dólares anualmente, não interessa que a criança goste do brinquedo. Interessa que ela queira muito comprar o próximo. Um brinquedo bom de verdade satisfaz a criança. E aí a indústria não vende o brinquedo seguinte para ela. Porque ela está satisfeita. E gente satisfeita não consome.
O que satisfaz de verdade a criança é brincar com as mãos. Elas adoram massinha, por exemplo. Esquecem da vida quando podem montar peças de LEGO ou bloquinhos de madeira. Estou para encontrar uma criança de três anos que resista a duas bacias, uma vazia, uma cheia, e uma esponja grande. As crianças não precisam do último lançamento da enorme indústria de bonecos e bonecas, mas vão se divertir por horas seguidas se puderem usar alguns pedaços de papelão, dois ou três rolos de papel e uma garrafa para fazerem seu próprio boneco. Com exatamente o mesmo dinheiro, pode-se comprar qualquer um dos dois divertimentos abaixo:
O primeiro é um penico para uma boneca. O segundo é um conjunto de doze cores de aquarela líquida.
É evidente que o primeiro vende muito mais, e é evidente que o segundo diverte por muito mais tempo. E nós sabemos disso. Por que é que, mesmo assim, adultos compram brinquedos que divertem menos, em vez de brinquedos que divertem mais?
Os brinquedos que só são interessantes na hora em que se compra foram desenvolvidos com anos de pesquisa e aprimoramento. O tamanho dos olhos da boneca, a cor da roupa, a textura do plástico do corpo e, acima de tudo, a embalagem. Tudo é feito com o comprador em vista, e o comprador não é a criança. Já os brinquedos que divertem mais são, de forma geral, muito menos chamativos, recebem muito menos publicidade e têm embalagens clássicas e com menos estímulos. Provocam-nos muito menos.
Claro, há a culpa. Nós passamos cada vez menos tempo com nossos filhos, em espaços cada vez menores. Isso faz com que nos sintamos sempre “devendo alguma coisa” para as crianças. A novidade é: estamos, mesmo. Mas nós não vamos resolver essa dívida com mais brinquedos ruins. Nem com brinquedos, só. Resolvemos com convivência, brincando juntos, lendo e cantando juntos. Até brincar de jogar bolinhas de papel no corredor do apartamento é melhor do que mais um boneco de plástico para limpar nos dias de faxina.
Perguntam-me com frequência quais brinquedos comprar para uma criança. Minha primeira resposta sempre é: Evite brinquedos que brincam sozinhos. A criança precisa poder fazer alguma coisa com as mãos. Se ela só vai balançar o objeto, apertar botões e fingir vozes, é um brinquedo pobre, que divertirá pouco e por pouco tempo. Por outro lado, se ela puder criar, transformar, colar, encaixar, e de quebra adquirir duas ou três habilidades novas, você encontrou um brinquedo que vale a pena. Os brinquedos que valem a pena são aqueles que dependem da criança para existir, que não são nada sem a criança. Os brinquedos que são alguma coisa, mesmo sem a criança por perto, em geral são menos brinquedos e mais objetos feitos para adultos gastarem dinheiro.
Maria Montessori, que além de psiquiatra era antropóloga, escreveu:
Nos países onde a indústria do brinquedo é menos avançada, você encontra crianças com gostos diferentes. Elas também são mais calmas, mas conscientes e felizes. Sua única vontade é participar das atividades que ocorrem à sua volta. São mais parecidas com gente comum, usando e manipulando as mesmas coisas que os adultos.
Maria Montessori, em Mente Absorvente
A rigor, as crianças não precisam de brinquedos. Em geral, os brinquedos são as migalhas que damos às crianças enquanto lhes negamos o mundo. Enquanto não permitimos o acesso à cozinha, à horta, à caixa de ferramentas e à lavanderia. Uma criança lavando o quintal ou o carro da família se diverte muito mais do que outra, jogando em um tablet. E todos nós lavamos alguma coisa: a louça, o banheiro, a varanda ou as roupas. Em geral, enquanto isso nossas crianças ficam brincando com brinquedos que ficariam bem mesmo se ela não estivesse ali.
Então, eu proponho uma revolução: na sua próxima ida a uma loja de brinquedos, não compre nada. Saia de lá, vá para uma papelaria, ou uma loja de cozinha, jardinagem, produtos de limpeza… E veja o que você pode comprar para que sua criança use a casa junto com você, com o mesmo dinheiro ou menos do que ia gastar na loja de brinquedos. Proponho ainda outra revolução: nem vá até a loja de brinquedos. Ande pela sua casa, e veja onde sua criança pode participar. Você descobrirá que a vida se transforma quando não nos rendemos à indústria do brinquedo, e quando seguimos nossas crianças de verdade.
Existem muitos caminhos para uma vida tranquila e feliz com as crianças. Se você quiser conhecer esses caminhos, venha ver o novo curso do Lar Montessori. Ele foi criado a partir de centenas de conversas com famílias e de um estudo profundo da obra montessoriana. Veja o que algumas famílias estão dizendo:
Parabéns pelo curso, por em apenas duas horas você conseguir sintetizar tantas coisas complexas de uma maneira que parece simples. Há 5 dias eu comprei o curso e assisti tudo. Só tenho a agradecer. A mudança é real.
Alan (pai)
Esse curso foi transformador, mesmo depois de ter feito vários outros cursos.
Jennifer Barbosa, mãe
Texto sensacional. Obrigado por compartilhar.
A assertividade do que propõem Maria Montessori é impressionante! E, a facilidade com que você, Gabriel Salomão, nos ensina a entender e aplicar os ensinamentos desta fabulosa mulher, também.
Depois de conhecer o Método Montessori a minha visão de brinquedo mudou consideravelmente. Vou citar um dos inúmeros exemplos… Meu filho de quase três anos passa muito tempo a brincar com um pedaço da bola que estourada. Ela cheia não durou 20 minutos porque estourou ao ser jogada sobre uma planta pontiaguda. Apesar de interessantes, bolas cheias são muito parecidas. Mas bola estourada, ah quanta coisa se pode fazer com ela! Quantas descobertas! Ela estourada já foi para uma bacia d´água para ele checar se ela flutua ou se afunda; Já virou navio de formigas; já virou chapéu, pulseira, sapato; foi enrolada como tapioca, recheada com outros objetos, já serviu de ponte e de terreno acidentado para carrinhos, já serviu de paninho para dormir abraçadinho… Ela cheia custou seis reais, estourada, não custou nada. Estourada já está conosco há meses e ele não se cansa de inventar algo novo para brincar com ela praticamente todos os dias. Além disto, ela não virou lixo.
E assim é com tantas outras coisas simples do dia a dia que muitas vezes jogamos fora, mas que, se dermos um pouco de atenção, poderia virar um brinquedo interessante.
Mais uma vez obrigada Salomão por você existir.
Um abraço e até abril, em seu curso de Introdução ao Método Montessori, aqui em Fortaleza.
Gabriel ! Que texto esclarecedor!!!
Gratidão
Amei!
Pensando no consumo consciente de brinquedos, criamos o Brinquedo Brincado, um portal de anúncios classificados exclusivo para brinquedos previamente brincados e acessórios infantis, estimulando a economia e o senso de reutilização.
http://www.brinquedobrincado.com.br
Gabriel mas eu tenho uma dúvida, como agir quando as nossas criancas vão em uma casa que tem um monte de brinquedos diferentes? Elas ficam deslumbradas e querem tudo, isso sem contar que passamos vergonha pq pelas nossas costas as pessoas ficam com dó dos nossos filhos por não terem tantos brinquedos.
ADORO seus posts!
Mas as vezes é tão difícil por na prática…
Obrigada por mais esse alerta e ajuda!
Muita luz no seu caminho!! Para que continues nos iluminando!!!