Nem Toda Brincadeira Precisa Ensinar

Deixem que as crianças sejam livres! Permitam que corram lá fora quando estiver chovendo, que removam seus sapatos quando encontrarem uma poça d’água, e, quando a grama estiver molhada de orvalho, que corram e pisem com os pés descalços. Deixem que descansem em paz quando uma árvore convida a dormir em sua sombra, que gritem e riam quando o sol acorda-lhes de manhã…

A frase é de Maria Montessori, em 1948, depois de estudar e viver com crianças por mais de meio século. Mas é distante do que muitos de nós fazemos com nossos filhos. Pela pressão de aproveitar os primeiros anos da infância para muito aprendizado e um bom desenvolvimento, longe se vão os dias de dançar na chuva, e longe se vão até os dias de deixar nas mãos da criança as panelas e as frutas da cozinha.

Em lugar da brincadeira “sem propósito” e cheia de vida, entregamos às crianças brinquedos bem construídos, para dar suporte ao desenvolvimento e para estimular seu aprendizado. Assim, as crianças não perdem tempo. Tempo, no nosso tempo, é recursos escasso, que não pode ser perdido. Esquecemos por enquanto que tempo é vida. Tempo despendido em brincadeira não se perde, se vive.

Queremos que nossos filhos se desenvolvam logo. Que aprendam logo as palavras, os números, os nomes das coisas. Que a independência venha aos jarros, e não em gotas, e que nossos filhos sejam os filhos dos vídeos que vemos. Mas não é isso que elas nós pedem. Elas nós pedem amor, paciência e liberdade.

Por que é que não permitimos à criança brincar “sem propósito”? Pela mesma razão que não lhe permitimos subir e descer uma escada de três degraus oito ou nove vezes. Cercamos as crianças dos brinquedos certos, em vez de lhe dar tempo para brincar, porque nós, adultos, não confiamos nas crianças. E mesmo assim as amamos. Porque amamos, sem confiar, damos tudo o que parece certo, mas não deixamos que ela faça suas escolhas.

Mas podemos mudar hoje. Hoje. Você não precisa esperar o dia acabar para isso mudar na vida de seus filhos.

Montessori nos disse que quando tiramos o mundo da criança e lhe damos brinquedos, tiramos dela a comida e damos migalhas. O mundo é amplo, e infinito em opções de brincadeira – algumas dessas opções, as que levam à concentração, nós chamamos de trabalho em Montessori – mas os flashcards, os brinquedos (até mesmo os educativos), as fichas de memorização… Tudo isso é finito. Tudo isso tem limites. Só o mundo e a criança é que têm uma relação infinita.

Na escola montessoriana há materiais, e na casa montessoriana com frequência há atividades preparadas. Essas são algumas das boas opções que a criança deve ter. Mas ela deve ter outras. Ela enxerga as opções que nós não vemos: brincar com um balde d’água, brincar no chuveiro, brincar com a terra do jardim ou dos vasos, ajuntar pedrinhas, rir do peixei no aquário sem ter de saber o nome científico de sua espécie. A criança busca as opções de que precisa, e nós precisamos ter olhos para ver.

Nem toda brincadeira precisa ensinar. Toda brincadeira livremente escolhida, que envolva a criança ativamente, fará bem a ela. No mínimo porque lhe trará alegria de viver, ânimo, felicidade. Talvez e bem provavelmente traga também oportunidades de desenvolvimento. A criança busca por essas. Mas, sobretudo, porque a brincadeira livre e alegre é que mostra à criança que o tempo não é escasso, que a vida não é urgente. Sobretudo, porque só a criança feliz é capaz de viver, de novo, com a mente e o corpo juntos, presente onde está, realizada no que faz.

Vamos afixar em nossos armários, espelhos e geladeiras a frase de Montessori: Deixem que as crianças sejam livres!, e vamos deixar. Vamos confiar na criança. Montessori disse, e você pode acreditar:

Liberte o potencial da criança, e você a transformará no mundo.


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5 comentários

  1. Fantástico tanto conhecimento compartilhado em um texto só! Maravilhosas palavras de Montessori… “Deixem as crianças serem livres…”

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