Como Montessori Ajuda seu Filho a se Acalmar (de verdade)

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Ninguém se acalma porque nós pedimos “calma!”. Não é assim que funciona. As pessoas ficam calmas quando suas necessidades são atendidas. Três das principais necessidades das crianças são comunicação, ordem e trabalho. Essas três necessidades foram chamadas, por Montessori, de Tendências Humanas.

Quando terminar este texto, você conseguirá ajudar seu filho a se acalmar, porque as necessidades dele estarão satisfeitas e ele se sentirá melhor. Considere este texto inclusive se você já enfrenta dificuldades. Observe seus filhos depois de ler, e você provavelmente verá o que dizemos aqui acontecendo na realidade.

Por que uma criança se sente agitada?

Quando uma necessidade importante da vida da criança não pode ser satisfeita, ela não tem certeza de que está tudo bem. Ela coloca sua vida em dúvida. Quando os adultos não se comunicam, ela se sente insegura e sem vínculos. Quando falta ordem, não tem certeza de como as coisas serão amanhã, e isso traz medo e angústia. Quando não pode trabalhar, usar seu corpo com propósito e foco, falta sentido para sua vida e ela se sente perdida e sem valor. A criança expressa isso com ansiedade, raiva, gritos, movimentos desastrados, choro, dificuldade para dormir e de muitas outras formas.

Como ajudar uma criança a se acalmar

Montessori insistia para que nós não tentássemos resolver cada comportamento difícil da criança como se ele fosse um problema separado. Temos que encontrar as causas por trás dos comportamentos. Se resolvermos as causas, os comportamentos se resolverão sozinhos. Muitas, muitas vezes as causas estão em tendências humanas desrespeitadas.

Como respeitar as Tendências Humanas

Primeira Tendência Humana – Comunicação

A primeira tendência humana que vamos analisar aqui é a da comunicação. A falta de comunicação pode levar pessoas ao completo desespero, e a boa comunicação pode ajudar a resolver quase qualquer situação e trazer paz para nossos corações.

Em minhas observações em escolas e lares, constatei que até 70-80% da comunicação entre adultos e crianças consiste em comandos e negações.

Isso é muito grave. Um comando é quando dizemos para a criança: “Faça isso, traga aquilo, vá até ali, fique aqui”. Uma negação é quando pedimos: “Pare de fazer isso, não toque aí, não suba lá, você não pode pegar isso”. Imagine que quase toda a sua comunicação do dia fosse assim. Com pessoas dizendo a você o que fazer e o que não fazer. Você se desesperaria. A vida da criança é quase completamente assim.

Para reverter isso, devemos nos comunicar com ela de verdade. Podemos perguntar o que está fazendo, e ouvir com interesse. Esses dias li um relato de uma garota que falava da adulta mais importante da vida dela, e ela dizia: “Quando a gente fala, ela nem mexe os dedos”. Ouvir com interesse. Além disso, falar coisas interessantes. Você pode, por exemplo:

  • Contar o que está fazendo (o que está cozinhando, ou como está cuidando da planta);
  • Contar histórias da sua infância, do passado da criança, ou do dia a dia;
  • Conversar sobre a saúde de um bicho de estimação ou de uma planta;
  • Sempre conversar sobre as emoções que você ou seu filho sentem, e nunca tornar uma emoção vergonhosa na vida de vocês.

Isso dará à criança sossego, paz mesmo, porque há quem converse com ela com dignidade, dê importância ao que ela diz, e conte a ela sobre o mundo de uma forma que é relevante. Ela se sente envolvida na comunidade da casa, e isso traz segurança. Há mais uma coisa que traz segurança para a criança…

Segunda Tendência Humana – Ordem

A criança acabou de chegar ao mundo. Principalmente as mais novas, realmente não conhecem isso aqui. Não sabem como as coisas funcionam e não se sentem nem um pouco seguras. Especialmente se tudo muda o tempo todo.

Ter uma casa organizada e previsível, uma rotina com rituais que se repetem e adultos coerentes no seu comportamento ajuda a criança a sentir que existe um chão firme sob seus pés.

Para manter a ordem no ambiente físico tenha em mente dois parâmetros: é importante que a casa seja organizadaprevisível. Organizada quer dizer que cada coisa tem seu lugar. Previsível, que esse lugar é sempre o mesmo. Tudo bem se a sua mesa de trabalho não for perfeitamente alinhada e sua pia não for brilhante. Mas é muito importante que o prato do almoço não esteja na mesa de centro e seu guarda-chuva em cima da mesa de jantar. Especialmente para a criança de 2 a 4 anos, a previsibilidade é fundamental. Ela precisa saber que vai encontrar o mundo sempre do mesmo jeito para ter coragem de se esforçar e se transformar. Se o mundo se transforma, ela se desespera.

Manter a ordem na rotina não quer dizer ter horários muito rígidos, mas sim fazer as coisas sempre na mesma sequência e do mesmo jeito. Isso ajuda a criança a prever o que virá depois, e dá a ela segurança para aproveitar o tempo da maneira que for melhor para o seu desenvolvimento. Viagens, mudanças na rotina e exceções devem ser comunicadas, se for possível, e especialmente as pontas do dia – ao acordar e antes de dormir – devem ser mantidas estruturadas sempre que você conseguir.

Manter a ordem no comportamento do adulto talvez seja o mais difícil. Nós criamos muitas regras e impomos nossas vontades. Para nos ajudar, Montessori sugeriu só três limites:

  • A criança não pode fazer nada que a coloque em risco, ou que coloque em risco seu desenvolvimento.
  • A crianã não pode fazer nada que coloque em risco a vida, o bem-estar ou o desenvolvimento de outros seres vivos.
  • A criança não pode fazer nada que danifique o seu ambiente, ou o de outros seres vivos.

Mas à parte disso, a criança pode fazer tudo. E especialmente, não deve ser interrompida, o que nos leva à próxima Tendência Humana.

Terceira Tendência Humana – Trabalho

Nós chamamos de trabalho todo tipo de atividade que a criança faz com força de vontade, foco e propósito. Algumas coisas que em geral se chama de brincadeira poderiam ser chamadas de trabalho, outras não. O trabalho é o que traz sentido para a vida da criança. E uma vida sem trabalho é uma vida sem sentido.

A criança precisa encontrar desafios, para seu corpo, suas mãos e seu pensamento. Podem ser coisas aparentemente muito simples, como subir um degrau, rasgar papel, ou usar uma espátula para cortar uma banana e servir. Ou pode ser algo bem mais complexo, como colocar a roupa para lavar, amarrar os próprios sapatos, dobrar panos de prato ou plantar e regar plantas.

Para descobrir qual o trabalho que nossos filhos pedem, podemos ficar atentos a:

  • Perguntas – às vezes uma pergunta sobre o que estamos fazendo sinaliza que a criança quer fazer também.
  • Tentativas desastradas – em vez de ficarmos bravos porque a criança derramou alguma coisa, podemos entender que ela está interessada em usar aquilo ou algo próximo e usar a comunicação para entender melhor.
  • Gestos silenciosos – a criança pode fazer coisas com as mãos que nos mostram que tipo de esforço ela está buscando, quando tenta ou finge fazer alguma coisa, por exemplo.

Quando desconfiamos de que a criança está atrás de trabalho, devemos preparar o cenário para que ela encontre poucas dificuldades e só tenha de superar um desafio de cada vez, e aí nós demonstramos como se faz, bem devagar, b-e-m devagar, e oferecemos à criança para ela tentar.

Quando a criança já está tentando, nunca interrompa. Nunca interrompa uma criança em alguma coisa que ela acredita que consegua fazer sozinha. A frase é de Montessori, que também disse: Nunca interrompa uma criança que progride, não importa quão lentamente.

Resumo

Se você leu esse texto pensando “É isso! Ah, se eu soubesse disso antes!” você não está sozinha(o). Eu já passei por inúmeras situações em que, ao lembrar das Tendências Humanas, descobri que havia uma solução possível. Aqui neste texto, só trabalhamos com três. Mais virão em breve. Mas você verá que essas já vão melhorar a vida de suas crianças, e a sua, muito rapidamente.

Lembre-se:

  • comunicação verdadeira;
  • ordem no ambiente, na rotina e na conduta do adulto;
  • trabalho significativo para o corpo, as mãos e a inteligência.

Se a criança puder se comunicar, puder viver uma vida previsível e puder ter propósito em suas ações, a tranquilidade é um resultado natural.

Conte como é na sua casa, eu quero saber, isso me ajuda a ajudar você e seus filhos.


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16 comentários

  1. Texto totalmente maravilhoso! Ah! se todas as pessoas que cuidam de crianças buscassem sempre esse tipo de material e verdadeiramente aplicassem no seu dia-a-dia com as crianças, tenho certeza que teríamos uma sociedade melhor. Parabéns Gabriel, continue com essa maravilhosa missão: disseminar conhecimentos. Obrigada por compartilhar…

  2. Olá
    Aqui em casa tenho
    Primogênito de 4anos muito esforçado bem agitado e meio que do contra
    o pouco que eu li no seu blog consegui passar para ele te encontrei quando ele fez 2anos graças a Deus que te encontrei melhorou muito.
    Caçula tem 2 anos faz exatamente tudo o que o irmão faz agora que está querendo falar tem muito ciúmes do irmão entao meio conturbado para chamar a atenção ele chora bastante.

  3. Lindo texto! Tento viver esses princípios montessorianos ao educar minha filha. Porém, algumas situações me sinto perdida. Qdo por exemplo ela não quer lavar o cabelo ou escovar os dentes. Tenho que obrigá-la a fazê-los. Sinto que a desrespeito qdo a obrigo a lavar os cabelos q não são meus; e da mesma forma escovar os dentes. Obrigo por ser uma necessidade. Como faço para convencê-la, sem a desrespeitar?

  4. Oi Gabriel, amo seus textos… Tenho uma filha de 3 anos e desde bebe aplicamos o metodo (nao de forma profunda pq nos falta conhecimento) e desconfiamos q nossa menina tem alguma alta habilidade ou superdotação e mesmo praticando esses valores q escreveu ela é muito, muito, muito nervosa e tem crises terriveis…oq Montessori falava sobre isso? Vc da alguma consultoria? Socorro!!! Desde ja muito obrigada 🙂

  5. Adorei o texto! Espero que ajude.
    Tenho um filha de 2 anos. Ela gosta de se vestir sozinha, nao quer ajuda, mas nao consegue finalizar a tarefa, fica frustrada e nervosa, nao sei como ajuda-la neste processo…

  6. Não consigo parar de pensar em como seria a minha infância e de minha geração se nossos pais tivessem essa conduta. Quanto respeito, quanto amor, afeto. Espero muito poder aplicar tudo com suavidade e leveza com a minha filha, e tentar transformar um pouquinho essa linhagem, essa ancestralidade de medo, desamparo e solidão. Grata demais por poder ter acesso a todas essas informações.

  7. Texto incrível. Educar é uma tarefa muito complexa, não nascemos com um manual, mas com o material científico de Montessori tudo fica mais leve.

  8. Gabriel.
    Gratidão por seu ensinamento tão claro, simples e poético. Você realmente me ajuda a ser um pai melhor. Este texto veio em boa hora, porque estamos estudando Montessori (Minha esposa e eu). Preparamos o ambiente e estamos nos preparando também, porem domingo passado (10/06) eu me vi numa situação de total descontrole. Eu que tentava acalmar minha filha de 4 anos, me descontrolei total e fui muito agressivo em minhas palavras e atitude. Hoje, mais calmo e lendo seu texto, consigo ver quão despreparado eu sou. Quanto preciso estudar e me conhecer para quebrar meus paradigmas. Por favor, continue escrevendo para nós “b-e-m devagar”…

  9. Sempre acompanho os textos e são maravilhosos. Parabéns pelo lindo trabalho! Gabriel tenho uma pergunta a fazer, a filha da minha prima tem 1 ano e 2 meses e é muito nervosa, quando a mãee diz nao, ela se bate e bate a cabeça no chão… Este texto também ajuda?

  10. Meu desafio está em como acolher duas crianças de idades diferentes (1,7 ano de diferença) ao mesmo tempo. Como auxiliar para que o menor faça o que a irmã faz, pois geralmente deseja e se interessa pelas atividades da irmã, e ao mesmo tempo continuar encorajando e oportunizando a maior a viver novas descobertas .

  11. Olá! Tenho um menino de 4 anos bem agitado. Mas ele é autista. Vou tentar usar esse técnica. Algumas coisas já fazemos com ele. Mas ele não fala muito e ás vezes não entendemos o que ele quer ou o que está sentindo. Então fico um pouco frustada em não conseguir ajudar ele em alguns momentos da maneira que ele precisa e gostaria.

  12. Parabéns Gabriel pelo ótimo trabalho! Estava somente buscando informações para um projeto de quarto e fiquei tão encantada com o conteúdo do seu site que vou compartilhar com quem puder!! Ainda não tenho filhos, mas quando tiver com certeza farei um curso com vcs.

  13. Como amo seus textos. Hoje meu filho tem 4 anos e você contribui muito para hoje eu ter uma criança calma no geral.
    Tenho uma grande dúvida.
    Quando meu filho do a irritado eu já o ensinei a não por a lingua, não bater (como um soco na parede) e não falar “que chato” mas me pergunto sempre: como ele vai por pra fora o que está sentindo? Sei que todos temos momento de irá, é natural do ser humano. Eu já sei controlar minhas emoções e ele como posso ajudá-lo? Pensei na saída que eu utilizo que é orando 😅

  14. Me senti confusa e triste. Como funcionará para minha filha, ter acesso a essa relação em casa mas nao na escola onde passa a maior parte do tempo.

  15. Olá! Tenho um certo conflito aqui em casa por causa de horários. O nosso forte não é rotina (por uma série de circunstâncias, em especial do trabalho, que fogem a nossa vontade). Mas o conflito está nos pais. Quando chega a hora de dormir, meu filho (1a3m) é muito resistente, quer continuar brincando. Eu acho que cabe a mim colocar limite no horário e explicar que no dia seguinte a gente continua. Guardo os brinquedos junto com ele para ensinar a organizar o quarto. Canto música e o coloco na cama. Mas o pai acha que se ele ainda quer brincar deve respeitar a vontade dele e o deixa brincando mesmo que seja 23h. Segundo ele, quando o filho cansa deita e dorme e o quarto fica uma zona. Então, devo botar limites de horário ou não? (Sem rigor é claro)

  16. Olá! Adorei a opção para ouvir o texto.
    Bem, em nossa casa, já fazemos de tudo para suprir as necessidades de comunicação, ordem e trabalho, como nas sugestões do seu texto. Somos incansáveis, acredite. O problema é que há momentos em que isso não é possível, como quando precisamos conversar ao telefone, ou pessoalmente com um atendente em um estabelecimento, ou quando estamos dirigindo, etc, etc. Nosso filho de 2 anos e meio não aguenta nem um minuto sem nossa atenção ou nosso apoio e fica nervoso e descontrolado. Está sendo difícil para nós.

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